Graças
às televendas e ao comércio via-Internet não é mais preciso sair de casa para
comprar-se um aparelho eletrodoméstico, fotográfico ou de informática.
Se você tiver sorte a sua compra chega dentro daquele
prazo de cinco dias úteis durante os quais você ficou esperando ansiosamente
pelo motoboy ou pelo caminhão de entregas
sem sair de casa nem para comprar pão na esquina.
Chegou o aparelho? Então saiba que nesse instante a
sua sorte acabou e que a sua paciência começará a ser testada, já que abrir a
embalagem e retirar a compra de dentro daquele sarcófago de isopor é tarefa que
nem Jó conseguiria levar a cabo sem xingar a mãe do fabricante. Você conseguiu?
Então saiba que agora não é mais a sua paciência que estará à prova. É a sua
inteligência!
Prepare-se para entender a linguagem cifrada que o
sádico fabricante utilizou para redigir as instruções de montagem do produto.
Como você não domina o jargão ali empregado, dificilmente conseguirá juntar as
peças e conectar os pinos no lugar certo, e não adianta olhar para as figuras
porque elas raramente correspondem ao modelo que você comprou.
Mas digamos que você seja paciente e habilidoso,
encaixe tudo onde achar mais fácil e ligue o fio preto à corrente elétrica da
casa. O suspense nessa hora é digno de um filme de Hitchcock: sucesso ou
explosão.
Oba, não explodiu? Então parta para as instruções de
operação e arme-se para a batalha decisiva dessa guerra. Abra o manual no
capítulo “Como fazer” e tente a mais simples das operações, possivelmente a
única que lhe interessa, como bater um bolo, falar ao telefone, escutar um CD
ou imprimir uma carta que está escrita há dias no seu computador. Aí você
ficará sabendo que a instrução desejada nem consta do manual. Ela é tão óbvia
que nem seu filho (ou neto) de quatro anos precisaria dela. Ainda assim, você
tentará o item que lhe parece mais adequado e verá que a instrução começa com
um odioso “Você Pode”. Exemplos: Você pode bater um bolo esquentando ao mesmo
tempo a tigela; Você pode falar concomitantemente com até dez pessoas pelo seu
celular; Você pode escutar o CD eliminando a voz do cantor; Você pode imprimir
um arquivo enquanto joga paciência no seu computador...
É claro que nada disso lhe interessa, mas se o
fabricante incluiu tais recursos é porque há gente que não viveria sem eles ou
porque eles encarecem o produto, aumentam o lucro da indústria e tornam tudo
obsoleto em pouco tempo.
— O quê? — perguntará um amigo. — O seu celular só serve
p’ra falar e escutar? O meu gela a cerveja na praia.
— Mas eu nem bebo cerveja...
Já outro amigo fará pouco caso da sua impressora:
— Esta porcaria só imprime? A minha escaneia, tira
cópia colorida, tem entrada pro cartão da câmera digital e ainda frita ovo.
Aí você espera que o amigo saia, pega o Manual e
procura atualizar-se com a tecnologia a fim de não passar mais vergonha. Vai ao
capítulo “Como fazer” e procura o macete para fritar um ovo na sua impressora,
mas vai desistir porque a instrução fatalmente começa assim: Você pode fritar
ovo e gelar a sua cerveja ao mesmo tempo...